quinta-feira, 20 de outubro de 2016

Conto para Elena

Agora você dormiu e encontro tempo para escrever, escrever para você. Escrever sempre foi um exercício para minha satisfação pessoal e agora uma enorme vontade de registrar o que estamos vivendo com o frescor dos acontecimentos e não com a memória. A maioria dos minutos tem sido eu e você, o dia passa veloz. Desconfiam, "não dá tempo?". Respondo com o silêncio, não me interessa mais justificar. Entreguei-me a esse tempo: intenso quando estamos juntas e escasso quando estou sozinha. É ambíguo mesmo, assim como a maternidade.
Hoje você faz cinco meses, nem todos os dias foram felizes, nem todos os dias foram sofridos ou tristes, mas foram sempre ambíguos. Eu venho aprendendo muito sobre entrega e vivendo com mais inteireza essa história de ser mãe. Começo a surfar nesse mar de ambiguidade ao invés de tomar onda atrás de onda na cabeça.
Você acordou. Mamada, choro, insiste no mamá, chora mais, você faz pum e seu pai sugere: banho? Sim, banho. Agora você está mais tranquila explorando movimentos no sofá. Choro. Papai pega você no colo para eu continuar a escrever.
Ao longo da gravidez sentia que estava me preparando para o parto e pensava muito sobre entrega, imaginava que a dor seria suportável porque eu estava disposta a entregar e entrar na dor como em um temaskal no qual você leva uma peia e sai renascido. Mas quando a dor chegou eu percebi que não estava preparada para morrer naquela dor. Lamento só perceber isso hoje, mas (...)
Não deu tempo de terminar. Amanhã você faz um ano e um mês e ainda tenho muitos cacos a recolher. Agora você está na escolinha e o tempo ainda não dá...

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