sexta-feira, 15 de julho de 2011

Catch a fire

Hoje eu acendi um incenso e desci. Desci porque eu precisava pegar o que restava de mim no andar de baixo. Enquanto eu descia percebi que fazia um bom tempo que eu não me sentia tão relaxada.
Quando eu voltei, abri a porta e da sala eu vi a fumaça, grossa, cinza. Estranhei, mas pensei que poderia ser a diferença da marca nova de incenso.
Entrei no quarto, sem pressa.
Achei engraçado quando olhei o pote, vários incensos queimando ao mesmo tempo, "que bonito, mas eu só acendi um".
Não achei tão engraçado quando eu vi queimar a carta de tarô que eu tinha desenhado. Ela era estranha, mas eu havia aprendido a gostar dela.
Eu toquei fogo no meu quarto. Tocar é entrar em contato com: eu me coloquei em contato com o fogo.
O relaxamento que eu sentia era tamanho que a fumaça aumentava e eu olhava, comecei a rir percebendo a toalha queimando, todos os incensos queimando, meus textos queimando, "que rapidez e eficiência".
Coloquei o pote embaixo da água da torneira, um pano úmido sobre a toalha, joguei-os fora. Recolhi as cinzas.
Precisei ver o fogo para entender?
Vai fogo, segue certeiro, transformando tudo o que não me serve mais.

feel that honey.

Esse texto não é um rascunho. Ele vem sendo digerido há alguns meses, e ele ficava ali, às vezes eu esquecia, eu lembrava, eu esquecia, eu lembrava. Na realidade eu não sabia o que escrever sobre amor X sacrifício, dinheiro X prosperidade.... eu não sabia. Convidada a refletir sobre isso e eu não sabia, simplesmente.
Um dia o peito abriu e o amor era só sentir, não havia mais do que me defender. Não havia mais o que atacar, principalmente, pois era muita vontade de deixar a vida entrar. E sacrifício não combinava mais com amor, teria que ser fluido, fluido, na bubuia... E era um prazer absurdo sentir esse amor todo invadindo meu ser, era uma alegria com cócegas. Generoso e largo, cabia o mundo todo num abraço.
E nesse dia não havia mais dinheiro ou prosperidade, era a obviedade da abundância. Abundância expressa numa vida farta por si só. Era um agradecer e um chorar, agradecer-chorar. Muita gratidão pela vida-como-ela-é, pelos amores passados e futuros, pela família amorosa, pelos amigos e amigas e pelos pequenos tesouros. Reencontrei cada tesouro que no caminho sem ver, guardei sem saber e, para minha surpresa, mesmo eu tendo dado-lhes as costas temporariamente, eles estavam ainda lá, me esperando sem pressa ou cobrança.
A melhor parte era o peito receptivo e leve. Um pequenino grão de areia, ainda muito sonhador, agora sim conseguia ver suas estrelas-guias e voltava a pensar em coisas de amor.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

páginas sinceras me interessam

fique atento se uma pessoa te oferece o caminho mais curto
fique atento
a música bate no ouvido e ressoa
os encontros a vida propicia e até o que não parece ser é
eu vi aquilo, te digo que vi, mas não sei te explicar como
é um olho que sente
tem uma magia rolando, eu estou deixando
a vida tem pressa e eu tenho pressa de vida
cada um sabe o preço do papel que tem
a música bate, agora, no peito
Flores e frutos da imagem com as quais eu faço essa viagem
forte, farta, bela
Pelo chão, muitos caroços como que restos dos nossos próprios sonhos devorados
Ainda mais linda, madura
Pura
e se tudo o que eu quero dizer para o mundo já está escrito
se nada do que eu escrevo é novidade e não te toca
não me importa eu passo os dias a reinventar os modos de dizer
o que importa dizer para mim mesma
para eu lembrar
escrevo como que tecendo uma colcha de retalhos
me empresta isso, isto e aquilo
formou
eu quero brigar com você e quero fazer as pazes

terça-feira, 5 de julho de 2011

tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas

obrigada grande espírito, por quem eu me tornarei por meio de tudo aquilo que me acontece.

e, então, ela fechou o livro e sorriu.

segunda-feira, 4 de julho de 2011

força



"pelas plantas dos pés subia um estremecimento de medo, o sussurro de que a terra poderia aprofundar-se. E de dentro erguiam-se certas borboletas batendo asas por todo o corpo". C.L.

Essa é uma das imagens mais fortes dos últimos tempos para mim. E força ganhou todo um novo entendimento após um círculo de mulheres, no qual brincamos com nossos ossos. Essa imagem reflete justamente o que não vemos com facilidade, mas o que nos dá estrutura e força, o que está dentro.

Clarice Lispector já disse que milhares de pessoas não tem coragem de prolongar-se um pouco mais nessa coisa desconhecida de "sentir-se", e preferem a mediocridade. Sentir o que está dentro de si e que se manifesta como borboletas: medo, raiva, alegria ou tristeza. Poder expressar esse sentir, ser verdadeiro consigo mesmo, ser doce e delicado é, então, que descoberta, ser forte. Mas ainda há a crença de que a força vem de um outro lugar, um lugar duro. A força pode ser mole, feminina.

Tentar separar o que é meu e o que é do outro. Compreender que mesmo nas situações mais ofensivas a sua pessoa, você está ali dentro e vai precisar confiar em você, porque se esperar vir de fora essa confiança, talvez você passe sua vida esperando.

Essas marchas que vêm acontecendo pelo país, pacíficas, as conquistas trazidas pela união de pessoas, serão expressão desse movimento? Conquistar liberdades com força e determinação, mas buscando essa força de um outro lugar. Sinal, talvez, de um outro mundo possível, onde cada vez mais vozes, possivelmente, coexistam?

E para conseguir ser forte, então, nesse novo modelo, é preciso confiar, confiar mesmo quando não se vê. É preciso um passo anterior, arriscar ser ridículo, ser tolo, amar e dar vexame, pedir o telefone do baterista que é amigo do fulano.... é, tem que estar disposto a arriscar aquela certeza, aquela imagem à qual você se agarra e acredita que é você. Arriscar que você também não é perfeito como gostaria de ser, mas você se respeita. Afinal, diria Clarice, (e)terna, "pelo amor de Deus, não queira fazer de você uma pessoa perfeita - não copie uma pessoa ideal, copie você mesma - é esse o único meio de viver".

Liberdade eu nunca quero te esquecer, para ir escolhendo viver, com meus ossos e minhas borboletas, na minha imperfeição.

ps: foto roubada, carinhosamente, de Mariana Camarote. Afinal, como disse um amigo querido: "que alegria pode a arte (do crime) em nossas vidas?"